Diário

27 de Novembro de 2025

Estávamos terminando de arrumar as coisas para irmos embora da casa da mãe dele, quando ele encontra uma bolsa, tira dela um caderno lilás e diz: "Olha, esse era o meu diário!". Ele não deixou que eu visse o conteúdo, e agora eu genuinamente não tenho vontade alguma de ler o que poderia estar escrito ali.

Foi uma situação chata, porque eu fiquei chateada na hora por ele ter dito "não" quando eu perguntei se podia ler, era como se aquela fosse uma parte da vida dele que eu não pudesse ter acesso, seja lá qual o motivo. Até o momento, ainda me falta palavras para exlicar o porquê de eu ter me sentido daquele jeito, ou até mesmo porque me sinto dessa forma ainda agora. 

Eu o disse que era por conta do tom que ele usou, e o fato daquilo ter me feito sentir como se eu estivesse sendo invasiva, e eu não queria isso – a última coisa que eu gostaria é que ele ficasse desconfortável com algo que eu fizesse, e naquele momento, foi como se eu tivesse feito algo de errado quando eu pedi para ver e ele negou.

Essa não é bem a verdade. Quer dizer, também não é mentira, mas eu realmente não sei explicar porque isso me impactou e continua me afetando mesmo o assunto tendo se encerrado.

Ele me disse, pouco depois de ter dito "não", que ele não queria que eu lesse porque pensou que eu ficaria brava porque ele, na época do diário, tinha escrito sobre a Juliana. Aparentemente sobre mim ele escreveu em outro caderno, que só deus sabe onde está e ele não quis procurar e eu nem sei quando vai querer, mas confesso que eu teria me sentido melhor se ele tivesse feito um pouco de esforço pra procurar, mesmo sabendo que naquele momento era inviável porque estávamos de saída.

Mesmo conversando sobre tudo o que falei até agora com ele, isso continua me atormentando. Eu só queria saber o que fazer para que esse sentimento acabasse logo.

Uns dias depois, eu resolvi mostrá-lo minhas pastas com desenhos da época da escola que tenho guardado, onde ele viu um desenho que um menino que gostava de mim (e eu nunca reciproquei) me entregou, a imagem de um coração pintado com lápis vermelho entre nossos nicks do Minecraft. Ele ficou com ciuminho e eu achei engraçado, então deixei que ele queimasse o desenho, já que eu era bem indiferente àquele papel, mas isso me fez lembrar do ocorrido do diário. Não sei nem se faz sentido comparar os dois acontecimentos.

Ele disse que tinha a intenção de se livrar das páginas onde escreveu sobre coisas que não concorda mais, mas meio que ficou por aí. Isso não incomoda ninguém mais além de mim mesma, igual o desenho não me incomodava. Se eu não tivesse aberto a pasta e visto a reação dele sobre o desenho, aquilo continuaria ali, porque não me afeta em nada e eu nunca tratei aquele desenho como algo além de uma recordação do que me foi entregue na época da escola, junto de vários outros desenhos de amigos, incluindo de gente com quem nunca mais tive contato. Mas eu deixei ele queimar, e isso me remeteu a frustração com o diário que continua lá, intacto.

"Eu escrevi duas páginas sobre ela, mas sabe quantas eu escrevi sobre você?". Treze páginas, que eu ainda não pude ler.

Para qualquer um que o pergunte, eu não sou uma pessoa ciumenta. Realmente não acho que sou, mas quando se trata da Juliana, é um tópico sensível. Talvez seja porque ela representa todas as minhas inseguranças. Ela me lembra de todos os momentos em que eu me frustrava e não achava que eu era o suficiente, porque era a Juliana quem ele gostava. Não importa quantas vezes ele me diga que era por mim que ele tinha sentimentos desde o começo, ou o quanto ele me acha melhor do que ela em todos os aspectos, ou como ele se arrepende de ter gostado dela algum dia, parece que sempre eu vou me lembrar disso e me deixar levar por esses sentimentos tão fúteis.

Então sim, ele escreveu sobre a Juliana naquele diário guardado dentro da bolsa que estava na sala, duas páginas que fosse, e isso me dói. E as treze páginas que ele escreveu sobre mim estão enfiadas em algum canto onde nem ele sabe qual é. Não se deu o trabalho de procurar até agora e nem sei se vai.

Logo depois de terminar esse parágrafo, falei com ele de novo sobre isso e me sinto extremamente repetitiva, como se eu não conseguisse deixar o assunto morrer. Sim, dá pra procurar o caderno, mas vai levar tempo e ele vai ter de deixar de fazer as coisas que queríamos fazer essa noite para ficar lá procurando, então é melhor deixar pra lá.

Eu queria que ele tivesse pensado em fazer isso sem eu ter que falar algo, mas novamente, isso não é importante para ele tanto quanto é para mim. Igual o desenho não importava para mim, mas importou para ele.

Pensei em falar de novo sobre o diário e perguntar quando ele pretende se livrar das páginas, mas acabei não falando.